Ontem, quando a enfermeira do posto de saúde aqui em BH aplicava os 0,3 ml da vacina da Pfizer Covid 19 no meu braço direito eu pensei …
Se o Thiago, meu sobrinho de Catalão – GO e Giuliano, meu vizinho de Alumínio – SP, que vi crescer desde a infância, tivessem tido essa benção de receber essa aparente insignificante injeção, talvez ainda estivessem vivos aqui conosco. Isso sem citar a Márcia, minha prima, o tio Kentian, o tio Seba, os meus amigos Marlon, Valentino, Marcelo, Gino e tantos outros amigos, conhecidos e desconhecidos que padeceram dessa doença cruel.

Na canção Oito Anos de Paula Toller, Gabriel, seu filho, pergunta a ela:
Porque a gente morre?
Eu com 56 anos, ainda continuo me perguntando isso, e ainda tenho outras perguntinhas:
Porque a gente nasce? e ainda,
Qual o sentido disso tudo?

Admiro os que tem respostas para essas questões na ponta da língua, baseada principalmente na sua crença religiosa.
Mas será que existem várias respostas verdadeiras, como a última opção na múltipla escolha do cursinho onde TAC ( todas as anteriores estão corretas ). Por outro lado, assinalar o NDA ( nenhuma das anteriores estão corretas ) significa dizer que tudo isso é por conta do acaso.
Por acaso várias moléculas se uniram um dia, não se sabe bem porque e formaram os aminoácidos. Ainda randomizadamente surgiu a vida básica em algum momento e depois de muitos e muitos acasos, nós finalmente aparecemos aqui nesse planeta tal qual somos.
Não é razoável supor a existência de um Deus que criou e bolou tudo isso tão bem? Percebam a natureza e a sua perfeição ou ainda notem como o seu corpo reage a um simples ferimento na pele, que dói para proteger a região, lançando em seguida uma defesa orquestrada contra os invasores externos e depois finalmente se inicia um processo de cicatrização muito eficaz.

Mas se existe um Deus criador, quem é o pai dele? Outra pergunta que não quer calar …
Na Opus Dei, o meu confidente padre Correia me garantia que depois da morte todas essas minhas questões existenciais seriam respondidas. Eu com 15 anos, numa tarde ensolarada mas fria de Curitiba, sentado num banco da praça Espanha, sonhei em morrer para saber a razão de tudo isso. Ainda bem que logo em seguida deu fome e fui comer um cachorro quente com duas vinas no Au Au e nunca mais pensei em suicídio.

Quando eventualmente um médico me disser no futuro que eu tenho um câncer no pâncreas metastático ( acabei de bater na madeira, viu ! ), a minha primeira reação será logicamente dar um piti no consultório igual a menino de 3 anos em shopping, mas depois, vou lembrar que finalmente terei as minhas respostas existenciais.
Algum desgraçado não disse um dia que é preciso ressignificar? – Eita palavra batida né, não adiantou o Bial me advertir no curso de como escrever bem, para não usá-la … Cá estou novamente usando a palavra mais desgastada da humanidade ultimamente!

Eu tinha certeza que o ócio da aposentadoria para alguém reflexivo e divagador como eu ia dar merda! O Pe Correia me alertava que a imaginação é a louca da casa…
Puxa, como eu queria ser como o seu Mario, meu pai, que de tão pragmático que era sempre tocou a vida mecanicamente, sempre correndo atrás de dinheiro para pagar os funcionários ou pagar o próximo papagaio que iria vencer no banco, não perdendo um minuto do seu precioso tempo com questões existenciais tão bobas e sem importância.
Mas eu infelizmente tive o azar ( tem muita gente evitando ou trocando essa palavra por má sorte, mas eu sou ainda um sujeito raiz, portanto é azar mesmo! ) de parecer como a Dona Mariko, minha mãe, que passou a vida toda em busca das respostas existenciais e uma pista quente para o sentido da vida.
Até nas crenças a minha querida mãe era bipolar… Tinha dias que ela era Padre Robson de Trindade – GO desde pequeninha, no outro dia, me ligava dizendo frustrada que já não acreditava mais em nenhum Deus.
Ao chegar em casa de uma consulta do médico oncologista em 2009 com meu pai, que na cara dura disse a ele que teria apenas no máximo um ano de vida, nos deitamos juntos lado a lado numa cama de casal em silêncio. Ambos olhando para o teto branco do quarto, quebrei o silêncio com a dica preciosa da Virgínia, minha esposa kardecista, para que ele quando acordasse do outro lado no Umbral, chamasse por Jesus para ser resgatado de lá.
Inicialmente, ele educadamente concordou e agradeceu a minha boa intenção, apesar da minha clara falta de convicção que ele deve ter percebido.
Depois de uns minutos ele falou:
” Sabe meu filho, não tem nada disso não … depois daqui não existe mais nada, vou voltar a ser apenas pó! “
Interessante como cada vivente neste país, encara à sua maneira os 27.959 dias ou 76,6 anos médios que o brasileiro tem de vida.
Há os que se engajam na vida por uma causa humanitária nobre, outros como Pe Correia doam a sua existência à Deus e ao próximo. Outros tem projetos menos nobres e questionáveis de poder e riqueza. Existe infelizmente a grande maioria de brasileiros que como Sísifo repetem incansavelmente a mesma rotina diária tomando várias conduções ao dia desde às 5 horas da manhã até às 11 horas da noite, repetindo de segunda a sexta feira a mesma rotina, apenas para sobreviver. E finalmente existem alguns voyeurs bon vivant como eu, que assistem a tudo isso buscando inspiração para as suas crônicas.
Aquele pensamento indesejado e invasivo veio novamente à minha mente:
Qual o sentido de tudo isso mesmo?

Se antes eu ficava tão absorto fazendo planos para o futuro, a maioria deles sonhos pequenos e mesquinhos, como novos destinos de viagem ou sonhos de consumo. Hoje troquei isso tudo por apenas viver cada dia intensamente e tentar quem sabe fazer algo por alguém, mas até isso tá difícil hoje em dia com tanta regra e patrulha na era Covid 19.
Na semana passada, ao visitar o meu cardiologista, topei sem querer com um asilo de idosos que fica vizinho à clínica dele na avenida do Contorno. Os velhinhos, apesar de ser 7 horas da manhã já estavam acordados e ligadões. Nos três minutos de contato visual pela grade que tivemos, era claro que eles ansiavam afeto, um abraço ou pelo menos uma simples atenção.
Ofereci a eles cortar os seus cabelos com a minha máquina Wahl, enquanto isso, imaginei que eles poderiam contar as suas histórias de vida para mim e eu em troca contaria os meus causos a eles, típica relação ganha – ganha do mundo capitalista.

Mas quando eu já estava combinando a minha visita no asilo na semana seguinte, recebo um beliscão no braço da minha Fofa, a caçula:
” Cê tá doido pai? Esqueceu que estamos na pandemia do Covid 19? , bora ver o Dr Simões, pois já estamos na hora da consulta encaixe !”
Ainda olhando para os meus quase amigos respondi:
” É mesmo Fofa, você tem razão! ”
É, o inferno com certeza está repleto de sujeitos bem intencionados como eu … Falei em voz baixa.

Rui Sergio Tsukuda – maio/21
https://aposenteidessavida.com/
Excelente texto para reflexão meu grande amigo Tsukuda.
Bem vindo ao time dos vacinados, infelizmente 428.256 brasileiros até o dia de hoje não tiveram essa bênção.
Abraço
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Obrigado Marcão . Uma simples vacina poderia pelo menos amenizar a gravidade da doença com recuperação aos infectados . Uma pena! Abraço
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Adorei o texto Rui!!!!! Muito bom! E que bom que já está vacinado!
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Oi Valéria , obrigado ! Passa ao Luciano , viu ! . Quando tudo isso passar vamos visitar vocês em São Bento do Sul ! Aguardem ! Abraço 😘
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Oi Rui, que bom! Recebeu ótima vacina. Pra mim foi a temida AstraZeneca, segunda dose só em julho. Sinto também pelas pessoas que não tiveram chance de recebê-las….
Adorei a crônica !! Abraços!!
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Oi Neide obrigado pelo incentivo. Pois é dizem que a vacina da Pfizer é mais eficiente . Mas entendo que a da Astra Zeneca e Coronavac também são boas . Todas elas não tem garantia total de não contrair a doença, mas só pelo fato de amenizar as consequências poderá ser a nossa salvação. Abraço
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É, Rui… nem preciso falar que componho o seu time, né?! hehehe
Não sei do grupo mais pragmático, mas apesar de dar de cara com a parede na busca por respostas, ainda prefiro ser assim. Se não encontramos sentido, vamos criando e assim vamos, né?!
Não posso deixar de dizer que uma vez, em meio a um papo cabeça com a minha mãe para contornar uma pequena crise minha, ela me respondeu este questionamento: “estamos aqui para dar e receber”.
Serviu-me na hora e me serve até hoje. No mais, vamos refletindo, vivendo e escrevendo pelo caminho, né?!
Parabéns pela crônica e pela vacina! Fiquei feliz com a notícia.
Grande abraço!
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Obrigado Fábio. Ser reflexivo ou pragmático não é opção , nascemos assim . Gostei da dica da sua mãe , vivendo e aprendendo. Grande abraço
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Boa Noite Rui !! Eu vou demorar um pouco mais para tomar a vacina para o Covid 19 , mas sigo me cuidando apesar de ter que se expor no dia a dia. Graças a Deus ninguém de minha família pegou a Covid 19. Não aguento mais ter que fazer o teste do PCR , pois aquele contonete enviado no nariz é terrível ( é exigência dos clientes ter testes negativo para poder entrar nas unidades fabris ). Quanto a crença depois da morte você sabe o que acredito e partilho todo dia com você. Grande Abraço Rui !!!
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Oi Kidão, em julho você estará vacinado ! Continue passando por aqui. Abraço Rui
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Muito bom texto, Rui, como sempre! A vida realmente é um enigma, mas concordo com a mãe do Fábio, sucinta e direta. Vivo assim, dando e recebendo, e sigo em frente… Abraço!
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Obrigado André ! Continue passando por aqui . Abraço
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