Ao pé da letra, volátil é tudo que pode voar como os pássaros. Na química é aquela substância que evapora, transforma em gás ou vapor em temperatura ambiente. Gasolina, é um bom exemplo disso.
Já no sentido figurado é sinônimo de variável, volúvel, inconstante ou instável, muito utilizado em finanças para caracterizar o atual mercado de ações.

Não sei se faz sentido, mas arrisco a dizer que as pessoas se tornaram muito voláteis ultimamente.
Quer um exemplo? Um dia desses, eu me dei conta que já estava há meia hora com o controle remoto da TV na mão direita, mudando obsessivamente de canal, começando pelo canal 750, descendo um a um até o canal 501 e compulsivamente refazendo esse mesmo ritual sem fim, mas nada de encontrar um programa que me satisfizesse naquele momento.
Depois, quando finalmente desisti de achar um programa na TV a cabo, fui no Netflix e repeti o mesmo loop tentando achar um filme que ainda não tivesse assistido e fosse minimamente interessante.
A muito custo, encontrei um filme com algum potencial de me agradar, mas antes tomei o cuidado de ir no Google, fazer uma pesquisa para me certificar que ele tinha pelo menos 70 % de aprovação dos espectadores, para então finalmente assisti-lo.

Mas confesso que a cada 15 minutos, eu dava uma pausa na película e voltada ao ritual anterior de zapear os canais a cabo, com receio de perder algum programa imperdível por lá. Então durante todo o filme eu fiquei em vigilância, com um olho no peixe e outro no gato.
Tenho percebido também muita urgência pairando no ar e noto que a respiração das pessoas se tornou curta e ansiosa. Tudo é para ontem! Como o dia ainda não foi estendido por decreto das 24 horas conhecidas, temos por enquanto somente essas horas disponíveis para fazer tudo o que podemos e melhor merecemos!
Para piorar, existem as malditas horas de sono “perdidas”. Sabiam que uma pessoa que viva por 80 anos e durma as recomendadas 8 horas por noite, “perderá” 26 anos, 7 meses e 6 dias dormindo. Um verdadeiro desperdício, não é?
Um amigo italiano workholic chamado Paolo Murgia, encontrou a solução para isso e condicionou o seu corpo, ao longo dos anos, a apenas 4 horas de sono diárias. Ele achava um absurdo perder tantas horas potenciais de trabalho dormindo.
Quando no ano passado eu soube da morte dele por Covid 19, o meu primeiro pensamento foi:
” É , agora Paolo, você poderá finalmente dormir por quanto tempo quiser sem culpa… ”
Tenho a impressão de que a busca pela felicidade se transformou numa competição contra o tempo. Há tanto para ser vivido e experimentado nas infinitas opções nesta vida transitória de fim marcado, que não há tempo a perder para nada. Qualquer tempinho perdido numa fila de supermercado ou banco nos aborrece tanto a ponto de nos estressar.

Mas o preço a se pagar pela ânsia de viver intensamente 50 anos em 5 é a superficialidade e a baixa resistência à frustração. Como nada nos sustenta ou satisfaz plenamente, agimos como tico tico no fubá nos nossos relacionamentos efêmeros. Em pouco tempo, a relação logo perde sentido, cansamos e partimos para outra e assim sucessivamente.
Algo parecido acontece com o nosso conhecimento. Sabendo o título, autor e resumo do livro ou filme por exemplo, já é o suficiente. Com isso nos tornamos rasos, com pouco conteúdo. No segundo porquê, entregamos a rapadura. Sabemos de tudo um pouco, mas nada em profundidade. Nos tornamos medíocres, infelizmente.
Buscamos a aprovação, através dos likes e curtidas dos nossos seguidores e amigos virtuais nas redes sociais, às nossas postagens de fotos e filmes editados, que mostram uma felicidade suspeita tão verdadeira quanto uma nota de 3 reais, num comportamento de manada para nos convencermos que de fato estamos no Norte verdadeiro. Mas esquecemos de que todo o circo montado é uma bolha e nos lavamos com água suja e mal cheirosa.

Se a aprovação da audiência não vem, já é um sinal de atenção. Um comentário maldoso de um hater mal intencionado então, pode nos deprimir. Estamos muito fragilizados, porque sabemos que no fundo somos sofismas ambulantes. Daí, ter muitos jovens Youtubers e Tiktokers milionários, com mais de um milhão de seguidores, deprimidos e alguns deles precocemente desistindo da vida, ser muito compreensível.

Os momentos presenciais, raros hoje em dia, são necessariamente contaminados com selfies e transmissões ao vivo.
No museu do Louvre, a princípio, consegui ficar no máximo a 10 metros da tela Monalisa de Da Vinci, porque os meus patrícios japoneses, chineses e coreanos na sua maioria, já estavam lá se acotovelando na minha frente, fazendo as suas selfies, mais preocupados certamente em impressionar os seus seguidores, do que aproveitar de corpo e alma aquele momento de estar próximo da tela mais famosa do mundo.
Quando finalmente eu consegui me aproximar da pequena tela de 77 x 53 cm e ficar contemplando- a por um minuto no máximo, me decepcionei … Tentei, mas não consegui ver nada de especial naquela moça da tela. Muita trovoada pra pouca chuva!
Pode parecer que sou um ser anacrônico e saudosista, mas quem vive de passado é museu, sebo ou brechó!

Me sinto um verdadeiro eleito por estar vivo e ainda operante neste fantástico momento histórico da humanidade. Nesse mundo on line super- hiper-conectado muito doido, onde todo o desenvolvimento humano até então, seja das artes ou história estão disponíveis com baixo custo em um clique do seu dedo indicador no celular, ou polegar, se você leitor(a) for mais novo(a) que eu.
Felizmente também nunca estivemos tão longevos e com melhor qualidade de vida na maturidade, se comparada a qualquer geração de homo sapiens que já passou por este planeta.
Mas as duas perguntas de um milhão de dólares cada, que não se calam são:
- Será que não daria pra fazer a omelete, sem quebrar tantos ovos assim?
- O preço a se pagar por tudo isso não estaria alto demais?

Rui Sergio Tsukuda – janeiro/22
https://aposenteidessavida.com/
Rui, obrigado por mais uma vez compartilhar seus sinceros sentimentos conosco!
Respondendo à sua pergunta número 2, muitas vezes eu acho que sim. Somos tomados por muitas demandas e a hiperconectividade tratou de piorar muito mais tudo isso. Eu, como alguém meio avesso ao celular e à conexão em tempo integral, queixo-me muito disso.
Mas também digo a mim mesmo que tenho o poder da escolha. Naquilo que posso, faço no meu tempo e do meu jeito, senão, ficaria encurralado por tanta presença em tantos lugares. O freio cabe a nós, né?!
Vejo a graça em buscar o melhor domínio de tudo isso, para que a essência ainda se faça presente.
Mais uma vez obrigado, são conteúdos mais que necessários, e ainda pouquíssimo abordados.
Abração, meu garoto!
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Oi Fábio, tô com você! Nadar contra a maré não é fácil, mas é a única possibilidade de sairmos desse círculo vicioso, tomarmos um ar e voltarmos na luta com a bateria carregada. Obrigado pelo comentário. Abração ☺️
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